Ainda carregamos a cruz?


 
por Alan Brizotti direto do Genizah!



"Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome cada dia a sua cruz e siga-me". (Lc. 9.23)

Cristianismo é caminho de cruz. Não é fácil assumir a cruz, ela exige uma dimensão de espiritualidade inteiramente outra. Uma espiritualidade para espelhar Cristo. Uma espiritualidade onde a renúncia em amor é vivida em toda sua intensidade. Renúncia em amor é a motivação do espírito para abraçar uma vocação difícil. É o desejo de andar com Cristo mesmo em terrenos íngremes. É viver um "estado de cruz", onde a vida focaliza o olhar de Deus. É a arriscada alegria do cruz-ar fronteiras do ego.

Platão dizia que "é mais feliz o justo na cruz do que o injusto que navega num mar de prazeres". Infelizmente, a síndrome do hedonismo tem conspirado contra a teologia da cruz. Nessa sociedade do espetáculo toda a ideia de dor é desprezada, exorcizam-se os "ais", foge-se do sofrimento. Perde-se a capacidade de aprender com a magnífica escola da dor. Perde-se a capacidade de transformar o pranto em dança. Perde-se a capacidade de"gloriar-se na cruz" (Gl. 6.14).

Jesus nos oferece uma prática cotidiana da espiritualidade que renuncia: "Tome a cada dia a sua cruz", essa frase está impregnada de uma realidade urbana, pública, uma realidade existencial plena, não é um simbolismo frio e distante, é uma nobreza que alcança cada dia e se oferece como mira de vida, bússola, direção histórica, caminho. Em tempos de descaminhos o melhor jeito de não perder de vista a estrada da comunhão e do carisma é abraçar a cruz numa atitude de renúncia plena de amor e graça. Na era da indiferença, temos o que abraçar.

Quando abraçamos a cruz, o kerigma, a proclamação honesta do evangelho da paz nos permite reproduzir o sentimento do Cristo da cruz - altruísmo. Olhamos não mais para o nosso estado, mas para o plano maior na mente de Deus. O que passa a acontecer é uma revolução da interioridade, uma abertura para a solidariedade do abraço e um desejo sempre feliz de impactar outras vidas. A prosperidade aqui não está em ganhar, mas em perder. Abençoado paradoxo.

Blaise Pascal disse: "Conhecer a Deus e, no entanto, nada conhecer sobre o nosso próprio e desprezível estado gera orgulho; reconhecer nosso infortúnio e conhecer nada sobre Deus é mero desespero; porém, se chegarmos a conhecer a Jesus Cristo, encontramos nosso verdadeiro equilíbrio, pois ali encontramos tanto o infortúnio humano como a glória de Deus".


Ainda carregamos a cruz?

0 comentários: